Seis violações de direitos provocadas pela Samarco contra familiares de desaparecidos

Imagem: Comunicação da Intersindical
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Familiares de pessoas desaparecidas depois do rompimento a barragem de Fundão, de propriedade da Samarco (Vale/VHP-Billiton), se reuniram nessa segunda-feira (23) com membros do Movimento do Atingidos por Barragens (MAB) para discutir a sua pauta de reivindicações e sobre como se organizar para garantir seus direitos e buscar caminhos para reconstruir a vida.

Participaram da atividade familiares que 18 dias após o desastre ainda não tiveram acesso aos corpos de seus entes queridos e vivem na angústia, vítimas do descaso da empresa.

Após a ruptura das barragens ocorrido no dia 5 de novembro, foram contabilizados 12 mortos, até agora. Desses, quatro corpos aguardam identificação. Na tarde de sexta-feira passada (20), foi divulgada a identificação do corpo do operário Samuel Vieira Albino, 34 anos. Mais cedo, naquele dia, a esposa de Samuel, Aline Ribeiro, e outros familiares de vítimas haviam feito um protesto em Mariana para cobrar agilidade e transparência nas buscas.

As famílias relataram violações de direitos que a empresa e o poder público têm provocado em suas vidas desde então. Entre elas estão:

1. Falta de transparência

As famílias afirmaram ter dificuldade para acessar informação desde o momento do desastre. “A todo o momento, desde que meu marido foi fichado, a empresa teve meu número e me ligava sempre. Naquele dia [da tragédia], ninguém me ligou”, contou Ana Paula A. Alexandre, esposa do trabalhador terceirizado Edinaldo Assis.

Esse foi um dos motivos que provocou o protesto das famílias na sexta-feira (20). Elas reclamaram que as buscas estavam sendo feitas “a portas fechadas”. Após a manifestação, foi tirada uma comissão representante das famílias para se reunir periodicamente com a empresa e o Corpo de Bombeiros para acompanhar as buscas.

2. Demora na identificação dos corpos

Dezoito dias após a tragédia, ainda há quatro corpos aguardando identificação. Os médicos voluntários da Rede de Médicos Populares, que também estavam presentes na reunião, questionaram essa demora do ponto de vista técnico. “Há, certamente, formas mais rápidas de identificar um corpo, mesmo que possa ser doloroso, como chamar a família para identificar”, falou uma das médicas presentes na reunião.

Uma das desaparecidas é Maria Eliza Lucas, mãe de Wanderey Lucas Filho. Ele lembrou que, como já faz tempo, os corpos já devem estar bem deteriorados, irreconhecíveis.

Em reunião com a Samarco na sexta passada, após o protesto, ele soube que foi encontrado um corpo feminino que seria levado nesta manhã para Belo Horizonte para identificação. Ele aguarda ansioso.

3. Assistência psicológica inadequada

Jaqueline Fernandes perdeu seu irmão, o operário Mateus Marques Fernandes. Ele deixou uma criança de cinco anos. Jaqueline conta que um psicólogo contratado pela Samarco atendeu o menino, que prometeu que daria um presente a ele e nunca mais apareceu. “Isso não se faz com uma criança que sequer compreendeu o que é perder um pai”, disse.

Outra esposa de um trabalhador desaparecido afirmou que, em menos de 15 dias, foi atendida por quatro psicólogos diferentes.

Os médicos questionaram qual a autonomia desses profissionais para atender às vítimas e também lembraram que há necessidade da relação de confiança entre os pacientes e esses profissionais.

4. Falta de acesso à memória e aos bens

Os parentes também afirmam que a empresa está dificultando o acesso aos pertences pessoais que os trabalhadores deixaram guardados no armário da empresa. A empresa teria dito às famílias que é necessária autorização judicial para tal.

5. A “ré” no controle da apuração do crime

“Fizeram de mim uma bolinha de tênis de mesa. Me mandaram procurar alguém da Samarco, chegando lá, essa pessoa não existia”, reclamou Wanderley.

Todo o aparato para fazer as investigações, envolvendo Corpo de Bombeiros, Polícia Militar e outros, está localizado na sede da empresa.

A economia da cidade de Mariana depende mais de 80% da mineração, principalmente da Samarco. A empresa possui grande poderio econômico e político na região, o que gera desconfiança e temor para os atingidos. “Me orientaram a abrir um boletim de ocorrência. Eu descrevi a situação e um sargento da PM me perguntou três vezes: você tem certeza que quer colocar isso no B.O.? Quer dizer, houve uma tentativa de desvincular o nome da Samarco”, contou um dos participantes da reunião.

6. Insegurança no trabalho, em especial dos terceirizados

Os trabalhadores mortos e desaparecidos eram de empresas terceirizadas. Em muitos setores, eles normalmente são expostos a situações de maior insegurança em comparação aos trabalhadores do quadro próprio das empresas. Os familiares relatam ausência de sistema de segurança na mineradora e uma provável ordem para os trabalhadores prosseguirem os trabalhos mesmo após ser identificada a possibilidade de risco.

“Ali não foi desastre natural, não foi Deus que criou e desabou, ali foi feito por uma empresa. Foi um crime, houve negligência e tem que haver punição”, afirma Jaqueline.

A luta por direitos

Devido a essas violações, os familiares construíram com o MAB uma pauta de reivindicações para apresentar à empresa, com os pontos que se seguem:

1. Direito de enterrar os mortos: continuidade e agilidade nas buscas e que a Samarco repasse recursos ao poder público para arcar com os custos.

2. Acesso à informação, diariamente e de forma irrestrita.

3. Acompanhamento psicológico com profissionais escolhidos pela própria família, com custo pago pela empresa.

4. Que haja séria investigação e que os responsáveis por este crime sejam punidos.

5. Que haja alguma forma de reparação para todas as famílias que perderam seus parentes.

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Fonte: MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens)

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