NR: alterações não simplificarão; flexibilizarão garantias

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Imagem: Comunicação da Intersindical
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Qualquer tipo de alteração não deve visar à simplificação, mas à ampliação da proteção aos brasileiros e ao incremento da fiscalização do cumprimento da legislação de SST. As alterações nas NR não vão simplificar, mas flexibilizar garantias de segurança e saúde dos trabalhadores.

Por Carlos Silva*

O governo anunciou no dia 30 de julho, os primeiros resultados do processo de desmonte das normas regulamentadoras (NR) de Segurança e Saúde no Trabalho (SST). Mesmo que o argumento governamental seja o de promover modernização e simplificação desse conjunto de normas, o caminho escolhido significa, na verdade, flexibilização que diminui as garantias de segurança e saúde dos trabalhadores.

A pretensão dos atuais governantes é a de alterar todas as NR atualmente em vigor. As primeiras a sofrerem mudanças foram a NR 1, que trata das disposições gerais sobre saúde e segurança, e a NR 12, sobre a segurança no trabalho com máquinas e equipamentos. Para a NR 2, sobre inspeção prévia, a opção escolhida não foi alterar, mas revogar.

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Como havia alertado anteriormente, inclusive requerendo ao governo que reconsiderasse o processo de desregulamentação das questões de segurança e saúde no trabalho, o Sinait reitera que as medidas que vêm sendo adotadas representam um imenso retrocesso social. Disso podem resultar aumento da morbidade e mortalidade no trabalho e reflexos negativos diretos sobre os resultados do setor econômico nacional, que terá que arcar com custos acidentários crescentes.

Especificamente em relação às NR cujas revisões saíram nessa semana, há inúmeras imprecisões no que foi defendido pelo governo.

A NR 12, por exemplo, foi apontada como desatualizada e de difícil aplicação pelas empresas. No entanto, nos últimos meses de 2019 portarias publicadas pelo Ministério da Economia, em grande parte demandadas por empregadores, atualizaram 8 NR, entre elas a 12.

Causa estranheza que as alegações de que as NR são extensas e de difícil acompanhamento partam exatamente dos que solicitam as alterações e que são responsáveis pelos custos da manutenção do ambiente de trabalho seguro e saudável, obrigação constitucional inescusável e promotora de maior produtividade, concorrência leal e inserção em mercados mais exigentes.

No país que acidenta mais de 700 mil trabalhadores por ano, dos quais cerca de 3 mil morrem, aproximadamente 15% desses episódios decorrem do manuseio inadequado de máquinas e equipamentos, o que indica provável inobservância das normas de prevenção estabelecidas na NR 12. Qualquer tipo de alteração não deve visar à simplificação, mas à ampliação da proteção aos brasileiros e ao incremento da fiscalização do cumprimento da legislação de SST.

As NR 1 e 2, por sua vez, aplicavam-se a todas as atividades e são de fundamental importância justamente por abranger todos os trabalhadores. Formam, com as demais NR, conjunto em que cada uma tem o seu papel na preservação da saúde e da integridade física dos trabalhadores.

Em total desprezo a essa visão holística do conjunto das NR, o governo atropelou décadas de estudos ao promover alterações na NR 1 e ao revogar a NR 2. Chama a atenção também que essas mudanças tenham sido feitas em apenas 7 meses, sem observar os trâmites necessários, com efeito que pode se mostrar desastroso ao equilíbrio desse conjunto de regramentos e à busca pelo desenvolvimento sustentável desejado.

Decreto

Na esteira do desmonte, o governo ainda editou, no dia 31 de julho, o Decreto 9.944, de 30 de julho de 2019, que traz o esvaziamento do atual modelo tripartite que sustenta a edição e revisão das normas. Esse modelo surgiu com as portarias 393, de 9 de abril de 1996, e 2, de 10 de abril de 1996, que trouxeram a compreensão de que não poderia haver a edição de novas NR, ou a revisão das antigas, sem instrumentos de participação e consulta. Essa sistemática exigiu a existência de uma comissão tripartite, com papel central na discussão, edição e alteração do regramento de SST, valorizando e respeitando plenamente o diálogo social.

Em análise preliminar, o Sinait chama a atenção para 2 pontos do Decreto: o artigo 10, que trata a Comissão Tripartite Paritária Permanente (CTPP) como órgão colegiado de natureza consultiva, e o inciso IV do artigo 11, que condiciona a participação da comissão tripartite no processo de revisão das NR a uma solicitação. A redação do inciso IV tem a seguinte forma: “Compete à Comissão Tripartite Paritária Permanente: elaborar estudos e, quando solicitado, participar do processo de revisão das normas regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho”.

São mudanças drásticas, tirando o caráter de centralidade da referida comissão e tornando-a meramente consultiva, e condicionando sua participação na elaboração e na alteração das NR a uma solicitação dos mandatários da vez. Dizendo estimular o diálogo das partes e fortalecer o modelo participativo, o governo, na prática, dá início ao fim da sistemática tripartite.

Ao tentar justificar o desmonte das NR, o governo divulgou estudo da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Economia que apontava que somente a revisão da NR 12 poderia reduzir até R$ 43,4 bilhões os custos do setor industrial, com aumento entre 0,5% e 1% da produção.

Ora, de acordo com estimativas da Organização Internacional do Trabalho (OIT), acidentes e adoecimentos ocupacionais consomem cerca de 4% do Produto Interno Bruto de cada país anualmente, o que significa, no Brasil, algo em torno de R$ 272 bi. Custo que será do empresariado e do Estado em termos monetários. Já os trabalhadores, por muitas vezes, pagam com suas próprias vidas. É uma conta que nem sequer faz sentido.

*Carlos Silva é Presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait)

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